Eu não sou formado em Letras nem sou professor de Português, mas como eu gosto muito de ler, adquiri, ao longo do tempo, sem falsa modéstia, uma certa fluência em nosso idioma.
Trabalhando com a diagramação de textos, sou obrigado a ler o conteúdo que chega às minhas mãos para realizar minha tarefa. E frequentemente me deparo com vícios de linguagem. São expressões erradas usadas no dia a dia, no falar coloquial das ruas que, em um livro, não cabem.
Assim como não vamos à praia de terno/tailleur nem às igrejas de sunga/biquini, devemos usar corretamente o nosso português, de acordo com o ambiente e a ocasião.
A seguir, listarei alguns exemplos de expressões erradas que costumo encontrar nos textos que recebo para diagramar. Saber construir um bom e correto conteúdo pode fazer uma grande diferença na aceitação de uma obra literária.
“Nada haver”
A forma correta é “nada a ver”. Essa expressão é usada para indicar que duas ou mais coisas não estão relacionadas, que uma coisa não corresponde ou diz respeito a outra.
- Eu não tenho nada a ver com esse assunto.
- Isso que você está falando não tem nada a ver!
“Fazem dois anos”
Quem nunca ouviu alguém falar assim?
A forma correta é “faz dois anos”. Quando usado para indicar tempo decorrido, o verbo fazer atua como um verbo impessoal, sem sujeito, sendo conjugado apenas na 3.ª pessoa do singular: faz duas horas, faz três dias, faz quatro semanas, faz doze meses, faz dois anos,
- Faz dois anos que eu moro em Salvador.
- Já faz trinta e dois anos que eu me apaixonei por você.
“Para mim fazer”
O carioca costuma muito usar esta expressão errada. E na sua cidade?
A forma correta é “para eu fazer”. Quando o pronome pessoal assumir a função de sujeito, sendo seguido por um verbo no infinitivo, deverá ser usado um pronome pessoal reto (eu).
- O professor deu muitos trabalhos para eu fazer.
- Aquele quebra-cabeça é para eu fazer nas férias.
Apenas deverá ser usado um pronome pessoal oblíquo (mim) quando a expressão tiver a função de objeto indireto.
- Ele enviou uma carta para mim.
- Você pode ler este papel para mim?
“Entre eu e você”
A forma correta é “entre mim e você” (com a 2ª pessoa do singular, fica entre mim e ti). A preposição entre exige pronomes pessoais do caso oblíquo (mim e ti), estando errado o uso de pronomes pessoais do caso reto (eu e tu) com essa preposição.
Mas se a ordem dos pronomes for invertida, usando a 3ª pessoa do singular, ou mesmo do plural, veja como fica: entre você e eu / entre vocês e eu.
- Esta situação deverá ser decidida apenas entre mim e ti.
- Acabou toda a amizade que havia entre ti e mim.
- Entre vocês e eu não há ninguém melhor.
Viver às custas de
Quem nunca ouviu dizer (ou leu) “fulano vive às custas de seu pai”?, querendo dizer que o tal fulano é sustentado pelo pai. Pois informo que é incorreto expressar-se assim.
Basta uma rápida pesquisa em qualquer motor de busca (como o Google ou o Yahoo), para encontrar diversos exemplos do uso desta expressão. No entanto, a expressão correta é “à custa de”. Esta é a única forma correta e comumente aceita na língua portuguesa.
Apesar de existirem diversos exemplos do uso da expressão “viver às custas de”, seja na internet, seja em jornais ou em revistas, a verdade é que a palavra “custas” é um substantivo (feminino) que tem um uso associado apenas a um contexto jurídico.
Por isso, não deve ser usado no sentido analisado anteriormente.
“Nada demais”
A forma correta é “nada de mais”. Essa expressão indica que nada fora do normal aconteceu, ou seja, que nada foi feito acima do que é considerado normal e habitual.
- A apresentação da estagiária não foi nada de mais.
- Ele não fez nada de mais, mas todos ficaram chateados.
“Pode vim, vai vim, deve vim”
As formas corretas são “pode vir”, “virá”, “deve vir”. As locuções verbais são formadas por um verbo auxiliar (pode, vai, deve) e por um verbo principal (vir). Apenas os verbos auxiliares podem ser flexionados em pessoa, número, tempo e modo. Os verbos principais apenas aparecem conjugados no infinitivo, particípio ou gerúndio.
- Pode vir aqui, por favor?
- Será que ele virá já amanhã?
- Minha mãe deve vir de avião.
“Eu vi ele, eu ouvi ele, eu chamei ele”
As formas corretas são: “eu o vi”, “eu o ouvi”, “eu o chamei”. Nas expressões erradas, o pronome ele atua como objeto direto, complementando verbos transitivos diretos. Assim, não deverá ser usado o pronome pessoal reto ele, mas um pronome pessoal oblíquo átono relativo à 3.ª pessoa do singular que assuma a função de objeto direto: o, a.
- Eu não o vi na escola hoje de manhã.
- Eu o ouvi chamando por mim no meio da multidão.
- Chamei-o de chato porque ele implicou comigo.
Observação: Nesta última frase-exemplo, foi dispensado o sujeito (eu), então, deve-se usar o objeto direto após o verbo. Nunca se começa uma frase pelo pronome.
Quando a frase está na negativa, o não atrai o pronome. Exemplo: Eu não o chamei de chato porque ele implicou comigo. O mesmo acontece com o que. Exemplo: Eu que o socorri, quando ele chorou.
“Meio-dia e meio”
A forma correta é “meio-dia e meia”. O numeral meia sofre flexão em gênero para concordar com o substantivo feminino hora, uma vez que essa expressão indica a décima segunda hora do dia – o meio-dia, mais meia hora.
- Já é meio-dia e meia?
- Estarei em sua casa ao meio-dia e meia.
“Ela mesmo fez”
A forma correta é “ela mesma fez”. Embora com alguns sentidos a palavra mesmo seja invariável, no caso em questão aceita flexão em gênero e número, concordando com o sujeito gramatical. Isso acontece porque a palavra mesmo atua como um adjetivo, reforçando que se trata da pessoa referida através do pronome.
- Ela mesma solucionou o problema.
- Ela mesma veio a sua procura.
“Se eu por, se eu ver, se eu manter”
As formas corretas são “se eu puser”, “se eu vir”, “se eu mantiver”. As construções se eu… e quando eu… implicam o uso do futuro do subjuntivo e não do infinitivo. Indicam o desejo ou a possibilidade de que algo aconteça no futuro. Embora o futuro do subjuntivo e o infinitivo pessoal sejam equivalentes nos verbos regulares, tal não acontece em vários verbos irregulares, apresentando formas verbais diferentes nesses dois tempos verbais.
- Fico com dores nos ombros se eu puser os braços para cima.
- Quando eu vir minha irmã na escola, entregarei a ela o lanche que você preparou.
- O que você fará se eu não mantiver a minha decisão?
“Há dez anos atrás”
A forma mais correta é “há dez anos” ou somente “dez anos atrás”. Embora frequentemente usada, inclusive por escritores renomados, esta expressão é considerada redundante. O advérbio atrás é desnecessário para indicar o passado, dado o verbo haver, conjugado como verbo impessoal, já indicar tempo decorrido.
- Há dez anos nasceu meu filho mais velho.
- Esta história aconteceu há dez anos.
- Dois anos atrás eu estava em Lisboa.
“Eles tem”, “eles vem”, “eles vêem”
A forma correta é “eles têm”, “eles vêm” (do verbo vir) e “eles veem” (do verbo ver). Quando na 3.ª pessoa do plural, os verbos ter e vir são conjugados de forma acentuada. Já o verbo ver, com o novo acordo ortográfico, perdeu o acento.
- Eles têm tudo o que precisam.
- Eles não têm o que nós temos.
- Eles veem o futuro através de suas percepções.
“Ele ti ama, ele mim ama, ele ti vê, ele mim vê”
As formas corretas são: “ele te ama”, “ele me ama”, “ele te vê”, “ele me vê”. Está errado o uso dos pronomes oblíquos tônicos mim e ti porque eles assumem a função de objeto indireto, sendo precedidos de preposições. Como o verbo amar e o verbo ver são transitivos diretos, deverão ser acompanhados de pronomes oblíquos átonos, que assumem a função de objeto direto: me, te, se, o, a, nos, vos, os, as.
- Será que ele me ama? É claro que ele te ama!
- Será que ela o ama? Sim, ela o ama.
- Ele te vê todos os dias. Não é suficiente?
- Por mais que eu me esforce, ele não me vê.
“Daqui há pouco”
A forma correta é “daqui a pouco”. A expressão daqui a indica algo que ainda não aconteceu, mas que começará em breve e terá seguimento no futuro: daqui a pouco, daqui a nada, daqui a um ano, daqui a um mês, daqui a cinco dias.
- Ele chegará daqui a pouco.
- Rápido, daqui a pouco já saio de casa!
A forma verbal há, do verbo haver, é usada para indicar tempo decorrido, algo que aconteceu no passado.
- Ele chegou em casa há pouco.
“Sentar na mesa”
A forma correta é “sentar à mesa”. Embora seja possível sentar na mesa, ou seja, em cima da mesa, essa expressão é erradamente utilizada para indicar o ato de se sentar próximo da mesa, normalmente em cadeiras ou bancos.
- Venham sentar à mesa para almoçar.
- Meninos, lavem as mãos antes de sentar à mesa.
- Eu sentei-me à mesa para discutir o assunto.
Se o verbo sentar(-se) for usado com o sentido de «pôr(-se) sobre um assento, as preposições corretas são em ou sobre.
- Sentou o filho na cadeira, sobre os joelhos.
- Sentou-se na poltrona.
- Sentei a menina na cama.
- Sentei-me no sofá, e ela, no chão.
- Sentou-se numa pedra, já cansado.
“Afim de”
A forma correta é “a fim de”. Esta locução prepositiva é popularmente utilizada para indicar vontade e interesse em alguém ou alguma coisa. Pode ser usada também para indicar uma intenção ou finalidade.
- Obrigada, mas não estou a fim de ir à praia.
- Você sabia que o Danilo está a fim de você?
- Você está dizendo isso a fim de me dissuadir.
A palavra afim também existe, atuando como adjetivo ou substantivo. Indica algo que é semelhante e tem afinidade, não devendo ser seguido da preposição de.
- As duas empresas se uniram para atingir interesses afins (ou semelhantes).
“Meia cansada”
A forma correta é “meio cansada”. Nesta expressão, a palavra meio atua como um advérbio, sinônimo de um tanto, um pouco, não completamente. Sendo um advérbio, é invariável em gênero e número, mantendo-se sempre igual independentemente de se referir a uma palavra no feminino ou no plural.
- Estou meio cansada da caminhada de ontem.
- Estou meio cansada da rotina do dia a dia.
“De vez enquando”
A forma correta é “de vez em quando”. Esta locução adverbial de tempo indica que alguma coisa não ocorre com muita frequência, apenas ocasionalmente, de tempo em tempos.
- De vez em quando eu ainda penso nela.
- Isso acontece apenas de vez em quando.
“Na medida em que” e “à medida que”
As duas expressões estão corretas, mas elas expressam sentidos distintos.
Se “na medida em que” tem sentido de causa e pode ser trocada por “porque” ou “visto que”, já a sua expressão gêmea, “à medida que”, indica uma progressão proporcional. Veja como:
- O calor vai aumentando à medida que o verão se aproxima.
- As casas dos países de clima temperado precisam ser construídas com mais cuidado na medida em que (ou porque) sofrem mais com as oscilações de temperatura a cada estação.
“De encontro a” e “ao encontro de”
Parece mesmo bobagem, mas trocar o “a” e o “de” de lugar em torno da palavra “encontro” pode, sim, fazer toda a diferença! Isso porque “de encontro a” é algo negativo, que indica uma oposição. Já “ao encontro de” é positivo, e mostra a afinidade entre duas coisas. Fica assim:
- A ascensão da sustentabilidade no cenário mundial vai de encontro aos interesses das empresas que preferem explorar o meio ambiente a cuidar dele.
- As feiras de alimentos orgânicos vão ao encontro dos produtores locais, que conseguem vender seus produtos a preços melhores.
Um grama, uma grama
Grama, enquanto medida, é uma palavra masculina. Embora termine com a letra “a”, ela é uma palavra que serve de exceção à regra geral, ensinada na escola. Desde cedo, somos ensinados a associar o gênero feminino a qualquer palavra que termine com a letra “a”. Contudo, grama (referente ao sentido da medida, como “300g” de presunto) é uma palavra masculina, logo por extenso se escreve (e se fala) “trezentos gramas de presunto”.
Mas se você se refere à planta grama, então, escreva no feminino.
- A grama do nosso quintal não está tão verde como no ano passado.
- Vá ao mercado e me traga duzentos gramas de queijo muçarela.
Outras expressões erradas
Aqui estão listadas somente vinte e duas expressões erradas que comumente aparecem em textos de jornais, revistas e livros ou são faladas no dia a dia. Existem muitas outras, é claro. Na medida do possível, eu as incluirei aqui, futuramente.
Se você conhece alguma expressão não incluída na lista e se deseja compartilhá-la conosco, escreva-a logo abaixo nos comentários. Ajude-nos a valorizar e preservar o nosso bom Português!
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Amigas dizem que não sorri tanto: ; conheça. – o verbo aqui, seria colocado na forma infinitiva ” SORRIR ‘ – pois como está, é pretérito perfeito, 1ª pessoa do singular. – Carlito – 13/06/2025.